No cenário geopolítico atual, as movimentações dos países asiáticos têm gerado análises e especulações sobre o futuro das relações internacionais. Um dos desenvolvimentos recentes mais comentados é a aproximação do Japão com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), o que acabou por incomodar substancialmente a China. Em abril deste ano, um acordo de cooperação na indústria de defesa firmado entre o Japão e a OTAN trouxe à tona um novo capítulo na política de segurança global, representando um desafio à tradicional postura pacifista japonesa e acendendo alertas em Pequim.

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Historicamente, o Japão foi forçado a adotar uma postura pacifista após a Segunda Guerra Mundial, com a famosa Constituição Japonesa, em seu artigo 9, proibindo o país de manter um exército tradicional – suas forças armadas limitam-se às chamadas forças de autodefesa. Durante décadas, a segurança do Japão foi majoritariamente garantida pelos Estados Unidos, com quem mantém uma aliança bilateral desde 1960. No entanto, as circunstâncias globais têm mudado significativamente, impulsionando o Japão a buscar novos aliados, além da proteção americana.

Esse movimento de aproximação com a OTAN não está isolado de contextos de tensão que envolvem diretamente o Japão, como a agressividade crescente da Coreia do Norte, que rotineiramente testa mísseis sobre o território japonês, e os conflitos territoriais com a China pelas Ilhas Senkaku. Mais distante, mas com efeito semelhante, a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022 serviu como um alarme para Tóquio, despertando o temor de que a instabilidade possa se alastrar para o leste asiático.

Ao cooperar com a OTAN, o Japão ganha acesso a tecnologia militar avançada, incluindo inteligência artificial para defesa e outras inovações do setor. Esta diversificação de parcerias reforça a posição do Japão, que não mais depende exclusivamente dos Estados Unidos para sua segurança. Em um potencial embate, por exemplo, sobre as disputadas Ilhas Senkaku, o apoio da OTAN poderia ser crucial para garantir um suporte internacional mais substancial.

Por outro lado, a parceria com o Japão permite à OTAN aumentar sua influência na região do Indo-Pacífico, SOMANDO forças contra a ascendente presença militar chinesa. Somado a isso, a OTAN tem nos Estados Unidos, seu principal membro, um interesse estratégico na expansão de suas alianças nessa área. Conhecer as movimentações militares da China e da Coreia do Norte de perto é uma vantagem tática relevante.

Como era de se esperar, a China não ficou nada satisfeita com essa aproximação. O país declarou-se contrário ao estreitamento dos laços entre o Japão e a OTAN, acusando a organização de se intrometer em assuntos de segurança da Ásia-Pacífico, região onde Beijing deseja manter sua preponderância. Em retaliação indireta, a China intensificou os exercícios militares conjuntos com Rússia e Bielorrússia e tem investido pesadamente na expansão de suas capacidades militares, especialmente no que tange à marinha e ao arsenal nuclear.

Outro ponto crítico desse contexto é Taiwan, cuja segurança e estabilidade são explicitamente mencionadas no acordo entre Japão e OTAN. A ilha é vista por Pequim como uma província rebelde e é de suma importância geoestratégica, sendo responsável por grande parte da produção mundial de semicondutores, vitais para tecnologia e equipamentos militares. A possibilidade de um conflito envolvendo Taiwan preocupa o Japão, que inevitavelmente estaria no centro de tal crise, especialmente agora reforçado por seus laços com a OTAN.

A especulação sobre a formação de uma “OTAN asiática” é incerta, dado o histórico complexo e as tensões entre nações asiáticas, como o Japão e a Coreia do Sul. No entanto, parcerias informais parecem estar se solidificando, como o grupo AP4, que inclui Austrália, Coreia do Sul, e Nova Zelândia, além do Japão. Essas nações partilham uma visão estratégica similar quanto ao equilíbrio de poder na região.

No futuro, espera-se que a cooperação entre Japão e OTAN evolua com exercícios militares conjuntos e projetos de defesa, simbolizando um Japão que, embora tendo emergido de sua sombra pacifista, agora almeja papel de protagonista nas coalizões militares globais. Para a China, entretanto, essa movimentação representa um potencial “cerco estratégico”, um desafio a mais na sua busca por consolidar-se como potência hegemônica na Ásia.

Este desenvolvimento ilustra como as fronteiras entre os teatros de operações europeus e asiáticos estão cada vez mais difusas. Para a OTAN, este é um momento de reflexão sobre a proteção dos valores democráticos em um cenário global diversificado. A grande questão permanece: essa nova rede de alianças contribuirá para uma maior estabilidade ou catalisará uma corrida armamentista acelerada na região? A resposta ainda está por vir.